Seminário missionário sobre o HIV-SIDA a decorrer de 26-28 de fevereiro 2002
Aproximou-se d’Ele um jovem e disse-Lhe: " Mestre, que hei-de fazer de bom para alcançar a vida eterna ? " Jesus respondeu-lhe: " Porque Me interrogas sobre o que é bom? Bom é um só. Mas se queres entrar na vida eterna, cumpre os mandamentos. " Quais? " perguntou ele. Retorquiu Jesus: Não matarás; não cometerás adultério; não roubarás; não levantarás falso testemunho; honra teu pai e tua mãe; e ainda amarás o teu próximo como a ti mesmo ".
No jovem, que o Evangelho de Mateus deixa sem nome, podemos reconhecer cada homem que conscientemente ou não, se aproxima de Cristo, Redentor do homem, e lhe coloca a questão moral. Para o jovem, mais do que uma pergunta sobre as normas a observar, trata-se de um questão de plenitude de significado para a vida. Esta é efectivamente, a aspiração que está no âmago de cada decisão e de cada acção humana, a inquietude secreta e o impulso íntimo que move a liberdade. Esta pergunta é em última análise, um apelo ao Bem absoluto que nos atrai e chama para Si, é o eco de uma vocação de Deus, origem e fim da vida do homem. Precisamente nesta perspectiva, o Concilio Vaticano II convidou a aperfeiçoar a teologia moral de modo que a sua exposição torne clara a sublime vocação que os fiéis receberam em Cristo, única resposta que sacia plenamente o anseio do seu coração.
O virus do HIV- SIDA é uma realidade, que a todos preocupa e mexe com as fibras mais íntimas de cada coração humano.
Tratar-lhe dos apectos morais e éticos requer rebuscar a pergunta do jovem de Mateus que interpela Cristo, pois esta pergunta essencial e irresistível na vida de cada homem, refere-se, de facto, ao bem moral a praticar e à vida eterna. O jovem intui que existe m nexo entre o bem moral e a plena realização do próprio destino.
O Virus do HIV-SIDA trunca a plena realização do destino do homem, quer seja atingido pessoalmente quer através dos seus caros.
E falar-lhe dos aspectos éticos e morais significa antes de mais, procurar-lhe o conceito: O termo " ética " deriva do grego " ethos ". Este indica os modelos de comportamento ( radicados por sua vez em modelos de pensamento e de experiências ) que são tipicos de uma população ou de um grupo social em uma determinada época.Se pode traduzir, também em maneira um pouco redutiva, simplesmente por " costume ".
Ora a ética, enquanto ciência e disciplina escolática, é uma reflexão sobre o " ethos ", ou seja sobre o comportamento humano, sobre suas premissas ideais. Uma reflexão crítica, enquanto dirigida a verificar o sentido e o valor de determinadas escolhas e acções, a discernir o que é aceite como verdadeiro e bom, para envolver o agir humano em direcção a formas melhores.
Uma outra reflexão pode ser pensada sobre a base da razão. Se pode dizer ética filosófica. Enquanto ciência ciência essa nasceu de Sócrates ( 369 – 399 ªC. ) Mas o termo " Ética "para indica-l.o foi usado pela primeira vez por Aristólteles ( 384-322 ª. C. ).
A ética é uma filosofia prática, enquanto é dirigida a regular o agir humano e as normas que o regulam. As várias expressões da actividade humana podem ser consideradas no seu sentido e no seu valor também sobre a base da razão iluminada pela Revelação. Se configura assim uma ética teológica, chamarda tambbém na tradição da cultura cristã, teologia moral. Essa não se opõm a ética filosófica e não a nega, mas a supõe, a assume, a confirma e a eleva á luz da Revelação proposta pelo magistério da Igreja.
É esta proposta do magistério que aqui nom interessa para refletirmos o que devemos fazer de bom para que não pereçamos de HIV-SIDA.
Antes de entrarmos ao vivo no problema é necessário fazer algumas premissas que se referem a óptica na qual afrontaremos o problema. Não reentra nesta âmbito afrontar o problema teológico da ligação entre pecado e mal físico. É verdade que do ponto de vista cristão o mal do mundo é fruto da culpa, mas a relação entre culpa original, culpa pessoal e doença é muito mais complexa e entretanto passa pela liberdade e responsabilidade das pessoas. Estamos conscientes todos que esta doença nem sempre se transmite por culpa pessoal, porque se transmite também no âmbito das situações lícitas ( uma transfusão, uma relação matrimonial ) ou também nos fetos, que são inocentes, nascidas de mães seropositivas. É verdade todavia, que o canal de transmissão é dado pelo sangue e pelos contactos de tipo sexual; portanto as mais importantes vias de transmissão são representadas pelas siringas nos tossicodependentes e das relações sexuais de qualquer tipo, mas especialemnte - pela pluralidade de partners – desde aquele de tipo homosexual; e este facto consente, por isso dizer que estas vias de transmissão são fruto da escolha que não podem ser excluidas da responsabilidade do homem.
Por isso é necessário que a linha ética seja mantida autónoma das ideologias, clara e coerente nos seus conteúdos e sobretudo, unitária e homogénea na sua proposta diante do mundo do sofrimento e daquele da cultura.
Existe antes de tudo uma posição que se inspira na visão do bem integral da pessoa: não se entende somente a evitar a infecção e o contagio, mas se propõe um modelo de vida que visa a promoção e a defesa de todo o bem da pessoa mesma. É a posição que mais marcadamente e explicitamente reencontramos nos documentos dos Bispos católicos e dos moralistas católicos.
Nesta óptica se entende sobretudo propor um ideal de sexualidade ordenada ao valor da família e da fidelidade conjugal, um quadro de valores que levem a superar a cultura de morte no mundo da droga no respeito da vida, da corporeidade e de uma criatividade positiva feita de empenho social e do respeito da sociedade.
Existe depois um modelo direi " medico-epidemológico " sem negar a bondade da proposta personalista integral, os sustentadores desta posição, constrangidos a afrontar quotidianamente as situações concretas dos sujeitos que são vítimas do mal e privados de orientamentos éticos, sustentam que lá onde não se possa obter a abstinência da droga e das relações sexuais, quando um dos dois cônjuges sexuais esteja em risco, se deve insistir sobre o emprego da seringa limpa e do preservativo. Mesmo se isto não resolve o problema da prevenção – dizem – a 100%, o pode resolver em uma certa percentagem. As percentagens contam para os epidemológicos e para a epidemia.
A esta hipótese se deve objectar que sobre o plano dos factos é necessário relevar antes de tudo que no caso dos toxicodependentes os sugerimentos de empregar a seringa ou a doação gratuita e sua distribuição em geral não deram êxito positivo, porque o drogado transcura estes sugerimentos por efeito da mesma psicologia de morte e de autodestruição e vê na troca das seringas um facto e um gesto patológico de solidariedade psicossocial. No que toca ao uso do preservativo para os homossexuais e para as pessoas que praticam a prostituição devemos dizer que uma ilusão ou falsa segurança poderia trazer graves consequências sobre a difusão do contágio.
Como o preservativo diminui o risco do contágio cerca de 7 vezes ( é admitida de facto uma falibilidade de 10-15% ), basta que um sujeito seropositivo, falsamente assegurado, multiplique por sete vezes os seus comportamentos a risco, para que anule as esperanças " epidemológicas "postas na salvaguarda prevista.
Mas existe algo maior: mesmo que o falimento do preservativo viesse a provocar o contágio de poucas pessoas – suponhamos os 10% de parter - seria sempre um grave dano com base a quanto dissemos sobre o valor da pessoa e também de uma só pessoa. Por outro lado, o ter dimunuido eventualmente a taxa de infecção em geral, mas mantém em vida o comportamento sexual aberrante ou desordenado não consente ver todo o bem do homem, do homem todo e de cada homem.
Concluindo, este modelo moral pode consentir um juízo compreensivo para aqueles sujeitos que a nível de responsabilidade, não obstante as melhores intenções e a melhor ajuda, não são capazes de dominar-se a si mesmos, mas assumido como metodologia de principio não consente uma verdadeira prevenção. ( pg 262 Elio Sgreccia, assistente do Santo Padre para as questões bioéticas ).
A situação se torna mais delicada quando se trata de vida conjugal regular onde um dos conjuges é seropositivo, e a relação conjugal normal constitui um direito-dever dos cônjuges.
É nesta óptica sobretudo, que também da parte de alguns moralistas católicos foi posto o problema da liceidade do uso do " preservativo " com a tentativa de evitar o contágio do conjuge ou evitar o nascimento de um filho que possa contrair o Sida, no caso em que o casal fosse ainda fértil.
Mesmo que possa parecer um particular secundário este do preservativo, com respeito a entidade do mal em expansão, na prática médica o problema da sua validade e liceidade ocupa uma certa importância.
Sobre este ponto em particular, diz Mrs. Elio Sgreccia, tenho presente o ensinamento compressivo dos vários episcopados e os trabalhos dos mais recentes moralistas autorizados. Suponho conhecida a posição da moral católica com relação a preservativos em função contraceptiva, posição expressa na encíclica " Humanae Vitae " e na exortação apostólica " Familiaris consortio ".
O problema, da parte de alguns moralistas, é avançado em relação não somente ao perigo do contágio, mas também em referimento ao n.º 15 da " humanae Vitae " em que determinados fármacos ( meios terapêuticos ) que têm características de contracepção são declarados lícitos quando constituem " meios terapêuticos necessários para curar doenças do organismo ". Pergunta-se se no caso do Sida o preservativo não pode ser considerado como " meio terapéutico ".
Antes de dar uma resposta, o mais possível adequada, é necessário fazer algumas observações.
A primeira, que não é de ordem ética mas de carácter médico-cientifico e portanto é decidida sobre este mesmo terreno, é aquela que já expusemos: trata-se de saber se o uso do condon seja seguramente válido e eficaz; a resposta já foi dada mais acima.
A nosso modo de ver entretanto não se pode aplicar ao uso do condon a característica de " meio terapêutico " como o pede a " Humanae vitae "( aqui na H.V.é um dos meios anticoncepcionais, que em si destroi a natureza do acto sexual ) no seu n.º 15, antes de mais:
Cremos que nem sequer devemos evocar o " principio de duplo efeito ".
Tal principio como se sabe exige que:
Ora no nosso caso o emprego do condon não é em si acto bom ou neutro mas comporta como efeito intrínseco a contracepção.
A austeridade que se impõe aos cônjuges, que poderiam ser não culpáveis totalmente do permissivismo na fase do contágio, é um daqueles sacrifícios que no seu estado de vida, - como em outras profissões e situações – se impõe por amor de um bem superior.
Isto não tira que sobre o plano subjectivo possam existir situações em que o recurso ao preservativo se possa apresentar não definível sobre o plano das responsabilidades subjectivas.
Mas objectivamente ocorre dizer com clareza aos cônjuges, onde um dos dois fosse seropositivo, que se querem ser seguros plenamente e se querem respeitar todos os valores do matrimónio, não podem pôr confiança no preservativo, mas sobre a abstenção das relações sexuais a risco
.É certo que o dilema continua, quando esta em jogos comportamentos sexuais aberrantes, ou em indivíduos que não têm responsaabilidades morais nos seus actos, ou são profissionais do sexo, ou por qualquer motivo depravados sexuais. A Igreja deverá de modo concreto encontrar soluções razoáveis para eles a fim de que a Cruz de Cristo seja para eles ocasião de salvação. Que fazer nestes casos?
Não devemos mais falar de "vítimas" em termos que subestimem a coragem, a dignidade e os dons dessas pessoas. Queremos estar prontos a trabalhar com todas as pessoas de boa vontade.
As igrejas estão vivendo com HIV-Aids/Sida. Os filhos de Deus estão a morrer de Sida. Como povo de fé, temos feito muito. Mas também deixamos de fazer muitas outras coisas. Confessamos nosso silêncio. Confessamos que às vezes nossas palavras e actos têm causado dano à dignidade das pessoas. Pregamos a boa nova de "que todos tenham vida e vida em abundância", mas pode ser que tenhamos contribuído à morte.Já é hora de falarmos a verdade. Hora de agirmos somente por amor. Hora de superarmos a fadiga e a negação. É hora de vivermos a esperança. As igrejas têm força. Elas têm credibilidade e estão enraizadas em comunidades. Isso lhes dá oportunidade de fazerem uma contribuição específica no combate ao HIV- Sida. Para enfrentar o desafio, as igrejas precisam de ser transformadas pela crise do HIV- /Sida a fim de serem, por sua vez, uma força de transformação, capaz de trazer cura, esperança e solidariedade a todas as pessoas afectadas por HIV- /Sida.
Por isso aqui estamos. Vêm a minha mente as palavras de um pastor Protestante Niemoller que dizia assim: " Vieram e prenderam os Hebreus, e eu não disse nada porque não era hebreu. Vieram e prenderam os comunistas, e eu não disse nada porque não era comunista. Vieram e prenderam os sindicalistas, e eu nada disse porque não era sindicalista. Depois vieram e prenderam-me a mim, mas não havia mais ninguém que podia dizer alguma coisa ".
É possivel fazer-se alguma coisa como cristãos que acreditam no Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob no Deus de Jesus Cristo. Este mal que atinge de modo drástico o homem tem solução e ela está nas nossas mãos. Lá onde o homem exclui Deus, existem várias explicações com relação a este mal, pois para eles o mal é apenas parte constitutiva necessária de um mundo em fase de evolução ( Darwin ), como a negatividade necessária, que faz avançar dialeticamente para o seu fim um processo histórico universal ( Hegel ); como o lado obscuro necessariamente existente de um mundo, que na sua majestosa harmonia é todavia o melhor dos mundos possíveis ( Leibniz ); como a consequência de um ordenamento social e económico errado ( Marx ); como um dado que está a significar que nós estamos submetidos a um destino cego, que devemos aceitar no modo mais resignante possível ( Stoa ).
Nós que somos seus discípulos devemos seguir a sua estrada no melhor modo possível e com todos os meios a nossa disposição.
DILEMAS
Mas nós sabemos a partir da experiência cultural, que por exemplo nos nossos ambientes, algumas sondagens e informações por exemplo, em lares legalmente constituidos por exemplo nunca se encontram homens estéreis. A esterilidade só é notável quando ela é impossibilidade de a mulher conceber. Nas familias antigas , desculpem a generalização , não existem homens estéreis, ou porque seus parentes assumem a impotência procriando por eles ou porque elas mesmas se assumem como mães que procuram se-l.o de facto. Isto não posso prova-l.o.
Mas há mais; o Dicastério para a Evangelização dos povos, a Propaganda fidei, para as terras de Missão tem uma cláusula que diz que os filhos outrora chamados ilegítimos têm direito a serem baptizados e inseridos na Igreja como membros do corpo de Cristo. Estes como sabemos provêm de matrimónios não constituidos legalmente, e certamente aqui, alguns sacerdotes e religiosas são filhos ilegitimos de seus pais ou mães como se chamava antigamente. Na prática pastoral, nós não excluimos esta gente,mesmo sabendo como elas adquirem os filhos, pois, sabemos quão dificil é a continência nestes casos. Nossos paroquianos, menos comprometidos certamente têm três a quatro mulheres, ou três a quatro homens. E o caso da continência em casos de risco de adquirir HIV Sida, é dificil po-l.o. Certamente o pastoralista nos vai resolver estas questões. Mas na nossa situação concreta o preservativo seria ou não a salvação do que nos resta ainda por salvar?
As igrejas estão vivendo com HIV-Aids/Sida. Os filhos de Deus estão morrendo de Aids/Sida. Como povo de fé, temos feito muito. Mas também deixamos de fazer muitas outras coisas. Confessamos nosso silêncio. Confessamos que às vezes nossas palavras e actos têm causado dano à dignidade das pessoas.
Pregamos a boa nova de "que todos tenham vida", mas pode ser que tenhamos contribuído à morte.
Já é hora de falarmos a verdade. Hora de agirmos somente por amor. Hora de superarmos a fatiga e a negação. É hora de vivermos a esperança.
As igrejas têm força. Elas têm credibilidade e estão enraizadas em comunidades. Isso lhes dá oportunidade de fazerem uma contribuição específica no combate ao HIV-Aids/Sida. Para enfrentar o desafio, as igrejas precisam ser transformadas pela crise do HIV-Aids/Sida a fim de serem, por sua vez, uma força de transformação, capaz de trazer cura, esperança e solidariedade a todas as pessoas afetadas por HIV-Aids/Sida.
Temos aprendido algumas lições práticas. Não devemos falar de "eles" e "nós" quando se trata do HIV-Aids/Sida. A dor e o temor dessa doença tocam-nos a todos, embora nossa maior atenção seja voltada às pessoas que vivem com HIV-Aids/Sida. Não devemos mais falar de "vítimas" em termos que subestimem a coragem, a dignidade e os dons dessas pessoas. Queremos estar prontos a trabalhar com todas as pessoas de boa vontade.
Enquanto igrejas, queremos assumir a responsabilidade de superar estigmas e discriminações existentes em nossas organizações. E queremos ser uma vigorosa voz moral que conclame nossas comunidades, nações e sociedades a respeitarem os direitos e a dignidade das pessoas que vivem com HIV-Aids/Sida e a condenarem atos que estigmatizem essas pessoas. A verdade é que somos todos criados à imagem de Deus. O que significa que discriminação é um pecado, e extigmatizar uma pessoa contraria a vontade de Deus.
Todas as culturas têm seu lado positivo e negativo. Na resposta ecumênica ao HIV-Aids/Sida, queremos valorizar os aspectos positivos da cultura e, quando necessário, questionar aqueles aspectos que fazem violência à dignidade das pessoas ou que promovem ou permitem morte. Teremos de examinar nossas culturas e aprender a ver como elas se coadunam com a ética cristã.
A gravidade da epidemia do HIV-Aids/Sida permitiu descobrirr mecanismos sistêmicos que favorecem injustiça e desigualdade social e que multiplicam os danos qua a Aids/Sida causa à vida:
. Violência e conflito
. Pobreza
. Práticas comerciais injustas
. Dívida
. Desigualdade de gênero
A crise não será resolvida simplesmente lidando com essas questões em si. Mas, a menos que elas sejam confrontadas e atacadas, a cadência diária de mortes não será freada.